terça-feira, 18 de agosto de 2009

OS EMBALOS DE SÁBADO EM PALMA



Sete horas da noite.
O sábado começa a ficar movimentado na Palma de 1967.
Em frente às “vendas” do Seu Miguel e do Seu Maninho, as charretes já estão “estacionadas”, Nesses locais o cheirinho do xixi dos cavalos começa a arder os olhos e o nariz de quem passa em direção à Rua do Cinema.
Joaquim Fiscal cumpre mais uma etapa da sua rotina: pega duas placas e as coloca nas duas extremidades da rua, nas esquinas da João Pinheiro e da Bias Fortes. Nas placas lê-se:”PROIBIDO O TRÁFEGO DE VEÍCULOS E ANIMAIS”.
A Rua do Cinema , aos poucos, vai se enchendo de gente. Seu Antônio Agrícola programou um filmaço para aquele sábado. As emissoras de rádio, tanto a Tupi, como a Nacional e a Rádio Globo tocam Elvis Presley quase o dia inteiro. Então, quando o cartaz de "No paraíso do Havaí" foi colocado na rua, todo mundo começou a combinar o cineminha do fim-de-semana.
Nas janelas da casa do gerente do banco, os casais de namorados começaram a se encostar. Nas calçadas os namorados mais firmes passeiam pra lá e pra cá.
Pelo meio da rua, as meninas, as mocinhas e as balzaquianas também passeiam, de uma ponta a outra da rua. Flertes. Olhares. Despistes. No ar, os cheiros de Lancaster, Toque de Amor, Vitess, Promessa, Madeiras do Oriente, Tabu se misturam.
Os rapazolas fazem poses , tendo nas mãos cigarros beverly, continental sem filtro e kent .
As meninas mascam chicletes de bola ping pong.
Por onde passam, fica um cheirinho de laquê .
Mini-saias estão começando a ser usadas e as calças-esporte fazem a cabeça das moçoilas. Sutians com bojo de espuma deixam os corpos mais sensuais.
De vez em quando alguns pais dão uma volta pela rua para a vigilância que, quase sempre, é burlada pela turminha que passeia e espera a hora do filme começar.
Sete e meia. Toca a sirene do cinema. Olhares aqui e acolá.
O irmãozinho de uma garota chega perto de um rapazinho e diz que a garota vai esperar por ele na quinta cadeira do lado direito do cinema. Como recompensa, ganha um pacote de balas de goma.
Continua o passeio.
Uma garota chega perto da amiga e pergunta:
- O Beto mandou perguntar se pode falar com você.
- Diz pra ele que sim.
( E era assim que tudo começava.)
Cinco para as oito. Toca a sirene. As lâmpadas do lado de fora do cinema começam a piscar. Está na hora. Todos correm para a bilheteria. Seu Antônio vende os ingressos. Garibalde já toma seu lugar para começar a exibição da fita. Difícil achar um lugar. Chegou a hora. Mais uma vez a sirene. Apagam-se as luzes do lado de fora. Os ventiladores são ligados. Quando começa o jornal da Atlântida o facho de luz que sai de trás é realçado pela fumaça dos cigarros que são fumados na parte de trás do cinema. Gritos. Berros. Elvis Presley aparece na tela.
A Rua do Cinema está vazia.
Quem não foi ao cinema foi para casa.
Os rapazes foram se vestir como Elvis ou como Roberto Carlos e as meninas foram se trocar e fazer novos penteados, com bastante laquê ou foram passar o cabelo a ferro ou fazer uma touca rapidinha para dar aquela alisadiinha.
Outras gotas de Lancaster, Vitess, Toque de Amor.
E estava todo mundo pronto pra subir a ladeira e dançar a noite toda no Clube Santa Cecília, num super-baile embalado pelo som do The Snakes.


Palma, 18 de agosto de 2009.


2 comentários:

Unknown disse...

Como assim "Uma garota chega perto da amiga e pergunta:
- O Beto mandou perguntar se pode falar com você.
- Diz pra ele que sim.
( E era assim que tudo começava."? É fantasioso ou foi assim que começou o namoro dos meus pais?

betometri.blogspot.com disse...

O cinema eu ainda peguei, com direito a rasante de morcego, mas o clube da ladeira, não. Já fui direto pro TAP, no tempo do Hélcio.