sexta-feira, 21 de agosto de 2009

É MÊS DE MAIO? TEM FESTA! TEM QUERMESSE.

Anjinhos da década de 1940, na frente da Igreja Matriz de
São Francisco de Assis.
Vigário da época: Padre Prette
.




Cai a noite. É mês de maio.
O friozinho ainda existe na cidade de Palma neste ano de 1959. O desmatamento ainda não é uma realidade e o efeito estufa é coisa de ficção científica. As cadeiras nas calçadas foram guardadas e nem chegou o inverno. As noites de outono já são bem frias.
Na maioria das casas, as meninas vestem pijaminhas de flanela antes de colocarem as vestimentas de anjo. Dona Zilica já entregou todas as asas encomendadas (por causa delas, muitos patos foram para as panelas). Os papelotes são retirados e os cachinhos caem enrolados pelos ombros dos “anjinhos”.
O santuário de Nossa Senhora de Fátima, recém inaugurado, ainda não é o templo escolhido para as coroações e festividades do mês de maio. Tudo se concentra na Igreja Matriz de São Francisco de Assis. Os sinos batem. Hoje é 1o de maio, dia de coroação, o que vai se repetir durante todo o mês. Nas reuniões preliminares já foram escolhidos todos os anjinhos que irão coroar, jogar flor, colocar o véu, a palma e oferecer o coração. A Gráfica “A Defesa” já imprimiu a maioria dos santinhos que são oferecidos ao final de cada coroação. Saquinhos de filó recheados de guloseimas ( bolos, doces e balas) também são oferecidos em algumas coroações a todas as meninas que se vestem de anjo.
É lá no Salão Dom Bosco que elas se preparam para coroar e é lá também que a festa é encerrada.
Em fila, elas cantam: e vão, em direção à igreja.
Mãezinha do céu
eu não sei rezar,
eu só sei dizer,
eu quero te amar.
Azul é teu manto,
Branco é teu véu,
Mãezinha eu quero
te ver lá no céu.
A igreja está cheia. Pais e mães se acotovelam para que possam ver de perto suas filhas no altar todo forrado com papel de seda amassado, com duas escadas laterais. No alto, a imagem da Imaculada Conceição espera seus anjos e a homenagem que se repete por todo mês.
“Ave Maria.
tão terna e boa
quero ofertar-te
esta coroa”.
Assim, com esta musiquinha bem simples, as meninas menores coroam. As mais velhas ( de 6, 7,8 anos ou mais um pouco) cantam músicas mais difíceis e mais elaboradas.
Colocada a coroa, os anjinhos jogam flores na “Mãe do Céu”, os sinos repicam e os pais “babam” pelas filhotas.
Todos saem em direção às barraquinhas montadas ao lado da igreja. Seu Ilídio foi o primeiro a chegar. Recebeu, uma a uma, as prendas para o leilão e as arrumou sobre a mesa no centro da barraca. Pencas de laranja, bananas e mexericas, frangos cobertos com papel celofane vermelho preso por um palito com uma azeitona na ponta, bolos e broas enfeitados com papel recortado , imitando rendas, garrafas de vinho, jarras de porcelana, bibelôs de louça, e mais uma infinidade de prendas. Debaixo da mesa, amarrados com embiras, frangos e galinhas.
Numa outra barraca, Dona Belarmina já mexe com uma grande concha, o enorme caldeirão cheio de leite com chocolate.A Da Paz ajuda, olhando a outra panela com leite para não entornar. Em cima das tábuas que servem de balcão em toda a volta da barraca, Dona Maria Freitas arruma as xícaras de louça com os pires que são usados pelas crianças para beberem o chocolate mais frio um pouco. Elas despejam o chocolate no pires e bebem. Não há água encanada na barraca. As louças são lavadas em bacias e caixas dágua colocadas no chão ao lado do fogão a lenha.
Na barraca do pastel, Dona Zilica comanda a mesa onde a massa é aberta e os pasteis são recheados. No fogão, um tacho com gordura quente e uma mulher abanando constantemente o fogo para evitar que se apague.
Lá no canto ouve-se o grito da criançada que se junta em volta de toda a barraca. Só de perto dá pra ver o porquê. Muitas casinhas de madeira dispostas em círculo e no meio delas, até meio tonto, um coelho preso pelas orelhas espera ser solto para tentar entrar em um delas. Apostas feitas com as fichinhas compradas por “um cruzeiro”, o coelho é solto e a gritaria da criançada começa.
Numa outra barraca, jovens casais de namorados brincam de pescaria , tentando com um arame retorcido como um anzol, preso num barbante, pegar uma plaquinha com um número enterrada numa caixa de areia.
Da janela lateral da igreja, lá do alto do coro, um baldinho preso numa corda sobe e desce levando fichinhas e trazendo pequenas prendas..
O frio aumenta. Mas isso não espanta as pessoas que procuram a barraca das barcas para balançar daqui pra lá, de lá pra cá, pra lá e pra cá, cada um puxando uma corda para fazer a barca subir cada vez mais. Em duplas, as pessoas se sentam nas barcas e o balanço começa. Quem se senta de costas para as barracas, quando a barca sobe, tem a bela vista do Cemitério. Alguns, depois do estômago cheio com algumas xícaras de chocolate, pacotes de pipocas e pastéis, não resistem ao balanço e: vupt! Batizam o parceiro com uma golfada.
A festa continua. As pessoas passeiam em volta da barraca do leilão onde, aos gritos de dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três, Seu Capitão leiloa e as prendas são arrematadas.
Fim de festa. Cada um vai pra sua casa. Os anjinhos já foram dormir. Os namoradinhos , de mãos dadas, descem a ladeira.
No outro dia, tudo recomeça. E assim vai até o dia 31 de maio. Todos os dias.
Amém!


Palma, 21 de agosto de 2009.


2 comentários:

betometri.blogspot.com disse...

Pelas histórias que Maria do Carmo me contava da sua infância, acredito que ela fez parte dessas coroações e dessas quermesses. Bons tempos!!

Unknown disse...

Nessa eu estava com certeza....eu erafeliz e não sabia...