quarta-feira, 12 de agosto de 2009

DIA DA ÁRVORE - Lembranças do Artur Bernardes

Dona Judith de Paula Freitas - Diretora



















Grupo Escolar Artur Bernardes lá pelos idos de 1960. Mais precisamente, agosto de 1961.
O friozinho ainda persiste nas manhãs de Palma. Alunos e alunas, comportadamente, brincam e conversam. Pasta de couro cheia de cadernos na mão, alguns com um embornal de brim com cadernos, livros, algumas bananas para a merenda e uma atiradeira, ou estilingue, para as brincadeiras na volta pra casa.
Algumas crianças trazem pacotinhos de arroz, feijão, sacos com batatas, cenouras, tomates, cebolas, folhas de couve e outras coisinhas para a sopa do recreio. Os meninos e meninas considerados mais pobres são os alunos da Caixa Escolar. Estes não precisam trazer nada para a sopa. Os produtos que os outros trazem são compartilhados entre todos.

E todos os dias, lá pelas oito e meia da manhã, o cheirinho da sopa da Dona Iná já se espalha pelo ar de todas as salas de aula.
Sete horas. Bate o sino. Dona Judith não espera. As professoras, por causa da rígida diretora, também não.
Entramos e vamos diretamente para o “galpão”. Cada um , militarmente, já sabe seu lugar na fila. Turma por turma, um por um, todos entram em forma. Silêncio. Ninguém fala. Ninguém se move. Ou um beliscão, um puxão de orelha ou até mesmo um safanão pode acabar com um risinho fora de hora.
Dona Judith inicia as orações. “Lembrai-vos, oh! Puríssima Virgem Maria...” ( até hoje esta oração ecoa na minha cabeça) Todo mundo, “fervorosamente”a acompanha. Depois, ainda em fila, cada turma segue para sua sala. Na sala de aula, ainda de pé, ao lado da carteira, cada um espera outra oração feita pela professora para poder se sentar.
Hoje é dia de “revista”. Mãos em cima das carteiras. Uma a uma, todas as unhas são olhadas, todas as orelhas inspecionadas, todas as cabeças fiscalizadas à procura de piolhos.
- Na sua orelha dá até para plantar um pé de couve!!!
- Nossa!!! Você trabalha na horta? Parece que sua unha está cheia de esterco!!!
Somente depois disso tudo é que a aula começa.
Na turma da terceira série, Dona Déa inicia um “bela” explicação sobre a importância da árvore em nossa vida. Fala que ela nos acompanha desde o nascimento, que nosso berço é feito de madeira, que nosso lápis é feito de madeira, nossas camas, mesas, cadeiras, etc até o nosso caixão na hora da nossa morte. Todos ouvem com atenção. Um olhar aqui, outro vem dali e a gente percebe que alguma coisa pode estar sendo tramada por algum menino mais levado. Realmente, a turma não é das mais fáceis: André, Aurora Maria, José Alberto (este que vos fala) , Roldão, Maria das Graças ( tem mais de uma) Lea, Áurea ( a Judas – você ainda vai saber o porquê), Randolfo José Antonio, Maria do Carmo. E outros que com certeza vão me perdoar pelo esquecimento. Afinal, são quarenta e oito anos...
Onze e meia. Sino. Todos arrumam o material. A vontade de chegar em casa para o almoço é deixada pra trás pelo José Alberto e pelo Randolfo que saem do Grupo gritando e pulando. De cada arvore arrancam um galho ou uma folha. E repetem, .zombeteiramente, os ensinamentos de Dona Déa. Os outros olham. Riem. E Áurea, com um sorrisinho maroto, observa mais atentamente.
Dia seguinte. Dia da Árvore. Todo o ritual se repete. Mas, somente até a chegada na sala de aula. Áurea, dirigindo-se à Dona Déa:
- Dona Déa. Ontem, O Zé Alberto e o Randolfo saíram da aula arrancando folha de tudo quanto é arvore.
Dona Déa se segura. Calmamente, chama:
- Randolfo e José Alberto, venham aqui na frente, por favor.
Os dois vão com medo. Mas, Dona Déa os acalma dizendo:
- Que gracinha!!!!! ( e nós, Randolfo e eu, acreditamos na “calma” e na “gracinha”) . Eu queria até saber como é que vocês pularam para arrancar as folhes. Deve ter sido de uma forma muito interessante. Mostrem pra turma. Todos devem querer ver.
Randolfo e Zé Alberto dão um pulo pra cima, erguem o braço e fazem o gesto como se estivessem tirando folhas e galhos.
Dona Déa repete o “Ah, que gracinha”! e dá a sentença.
-Então, se vocês gostam de pular e de arrancar folhas e galhos de árvore, vão ficar sem recreio e vão pular, como ontem, de agora até as onze e meia, quando a aula terminar.
Até hoje, quando me lembro, a perna dói. Toda vez que arranco uma folha de uma árvore, eu me lembro da Dona Déa.
Ainda há poucos dias, falei com o Randolfo sobre isso.
Ah!!! Áurea!!!!
Que saudade da dor na perna e da gargalhada na volta pra casa!
Obrigado, Dona Déa, por aquele dia. Valeu, pela boa e engraçada
lembrança que tenho hoje.
Palma, 12 de agosto de 2009.


Foto de 1959- da esquerda para a direita: Professoras dona Ieda, dona Romilda, dona Odette, Diretora dona Judite, Professoras dona Eny, dona Percy e dona Filinha.

(que pena! Faltou a Dona Déa)

Um comentário:

Unknown disse...

Que você não foi fácil, eu já sabia, agora contado por você, não.